A Origem da Central Paracósmica - Capitulo 4
- Malp Dragon
- 23 de jan.
- 6 min de leitura
Titulo Forçado

Senti-me como uma alfineteira.
Tantos olhares me perfuravam com intenções claras como o sol. Se não estivéssemos no mesmo time, imagino que eu sairia daqui como um queijo suíço.
Observei os cinco pares de olhos e o único solitário com breves pausas. Não era necessário ser um gênio para notar a raiva por trás de cada cor.
— Pode nos explicar que merda tá acontecendo? — disse o baixinho com rabo de rato. Era difícil ver seu rosto, mas os olhos refletiam um vermelho semelhante ao meu. O resto do corpo estava oculto pelas dúzias de ratos de diferentes cores que se agarravam a ele como uma capa viva.
— Sinceramente, eu também queria saber, vossa alteza — zombei com uma reverência.
O Rei-Rato — sim, esse era seu nome — deu um passo pesado em minha direção, mas foi contido pelo longo braço do único membro usando terno. Suas feições, comumente escondidas por um pano branco, estavam expostas, revelando seu hibridismo insetoide. Ninguém sabia ao certo se era de louva-a-deus ou bicho-galho.
— Calma, Rei. Não vamos começar uma briga desnecessária — disse Slender, olhando o diminuto de cima. Sua grande altura como sempre o destacava, mesmo sentado. — E não o provoque, Sonhador. A situação não é uma piada.
— E você acha que eu não sei? — grunhi, deixando o corpo cair para trás enquanto me envolvia em aura. Um puff de ar invisível se materializou para receber meu peso, como uma poltrona improvisada. — Estou tão zangado com isso quanto vocês.
A sala onde estávamos era grande e vazia, com paredes nuas que ecoavam qualquer som. Era um local usado para treinamentos e testes, um espaço sem adornos, só com o necessário para essas atividades. A frieza do ambiente parecia intensificar a tensão no ar.
— Foi por isso que sua filha tentou expor a magia ao mundo? — Mechion flutuou o grão brilhante que era seu ser até perto de mim. Mesmo sem o olho robótico do corpo que construiu, eu o sentia dentro de minha cabeça, procurando algo que não podia achar.
O orbiam era a fonte de toda a tecnologia metálica da Terra e a razão de as ondas de rádio funcionarem no planeta. Com certeza, era o membro mais velho de todos os guardiões. Entretanto, nem isso era capaz de passar pelas barreiras naturais da Conexão.
— Sim, mas eu não mandei ela. — Sorri, vendo a expressão dos outros fechar ainda mais. — E tenho muito orgulho dela por isso.
— É por coisas assim que nossos líderes criaram essa droga de posto! — Berrou Kraken, uma mistura de lula e polvo que possuía vinte tentáculos. Sua aura rosa emanava ao redor do corpo para conter seu tamanho real. — Afinal, o que seria a droga de um vice-líder?
— Alguém abaixo do líder, molusco — comentou o outro animal desperto da sala. O gavial cinzento emanava uma aura verde com o mesmo efeito de contenção de massa —, mas acima dos demais membros.
— Nos mais de cinco mil anos desse grupo, um título assim nunca existiu! — O dito molusco apontou um tentáculo para mim enquanto eu, distraído, usava magia para limpar meus óculos, o que só fez aumentar a tensão no ar. — Foi graças a esse idiota que nossos líderes tiveram essa brilhante ideia!
— Falando assim, parece que foi uma ideia espontânea só para controlar ele — apontou o membro que competia comigo pelo posto de mais largado nessa reunião. Sua toga cobria apenas a parte inferior do corpo, enquanto o resto, bronzeado, estava acomodado em um trono de ouro, confortável apenas graças à magia que emanava dele —, mas se esse fosse o caso, nós não estaríamos inclusos.
Eu pensei a mesma coisa quando recebi a mensagem de Mechion. Até onde parecia, tudo foi uma votação rápida para dar um título novo para mim como forma de barrar minhas saídas para a Terra e outros planetas. Entretanto, essa reunião mostrava uma realidade ainda mais complexa. Uma que eu aproveitaria ao máximo.
— Midos está certo. — Ajeitei o puff invisível em uma cadeira de plástico padrão, sentando um pouco mais ereto e deixando o posto de largadão para o descendente de Midas. — A escolha de nós sete foi muito bem planejada para ser espontânea. Eles devem estar planejando isso há meses.
— Se está querendo tirar o seu da reta… — Não deixei o Kraken terminar.
— Eu posso ser o mais porra louca daqui, mas nenhum de vocês está livre de repreensão! — Cortei. — Exceto o Mechion. Ele é neutro demais para ser comparado a nós.
— Obrigado? — Ele questionou com um movimento similar a um cachorro virando a cabeça de lado por não entender um comando.
— Não há de quê, Bot — brinquei, levantando da cadeira. — A quantidade de destruição e confusão que vocês já causaram é comparável à vez em que um idiota colocou álcool no meu guaraná, sem saber que era proibido. O próprio Midos destruiu uma cidade na última missão dele e todos sabem a trabalheira que isso deu.
O dito cujo só balançou as mãos com um sorriso e se largou ainda mais em seu trono. Agora as pernas estavam livres para balançar longe do chão.
Ninguém quis dar o braço a torcer, mas notei que houve alguns desvios de olhares de cada um. Todos tinham motivo para estarem nessa sala e eles sabiam muito bem.
— Sendo sincero, não é a primeira vez que tentam fazer isso — disse o gavial. — Acho que a última tentativa foi há uns mil e seiscentos anos.
— Megalo, aquilo foi uma contenção emergencial por causa de nossa briga — corrigiu o Kraken, apertando os lados da cabeça com dois pares de tentáculos. — Foi algo totalmente diferente do que isso!
— Mas isso só prova o meu ponto — retrucou o gavial, sorrindo.
Caminhei até o Rei-Rato e estiquei a mão. Os ratos entenderam minha intenção e começaram a se dirigir a mim, assustando o único que conseguia ser menor do que eu ali.
— O que vocês estão fazendo? — Gritou, enquanto usava sua aura para mover a luz ao seu redor, ficando invisível. — Voltem aqui agora!
— Não se preocupe, majestade. Isso vai ser rápido.
Concentrei minha aura ao meu redor. Combinando liberilis e contrilis para criar visilis. Com ela, pude ver os detalhes que meus olhos não conseguiam captar, como os grampos físicos em alguns dos ratos.
Um movimento esperto, mas algo que imaginei que o líder do ratinho tentaria. Com minha aura, retirei os objetos sem ferir os animais e os deixei voltar para seu rei.
— Parece que o Manopla não conseguiu deixar as mãos dentro das luvas dessa vez — zombei antes de apertar os aparelhos com toda a raiva que guardei, quebrando-os. — Mas devo admitir que foi esperto ao não usar escutas astrais.
Em um momento de compreensão, os demais usaram suas próprias habilidades para procurar escutas neles, mas não encontraram nada. Eu esperava que perguntassem como eu adivinhei, mas a pergunta que o roedor me fez já era uma resposta em si.
— Foi você que deu a ideia dos ratos grampeados para espionagem?
— Foi a Gina — contei, voltando para meu canto. — Uma ideia esperta. Só achei que ele poderia aproveitar para ouvir nossas opiniões.
— Bem… Isso já vazou — disse o meio-rato, abaixando a cabeça. — Desculpa, pessoal. Eu devia ter conferido eles.
— Pode até ser, mas agora eles não vão saber uma coisa. — Com essas palavras, deixei o silêncio aumentar o suspense, trocando olhares com os seis.
— O quê? — Foi Slender quem quebrou o silêncio com a pergunta na mente deles.
Eu sorri, ajustando minha postura como quem se prepara para uma luta séria em um jogo. Enchi meus pulmões de ar, carregando-os com aura para que todos entendessem minhas intenções da melhor forma possível.
— Como vamos tomar o controle desse título.
Os seis demoraram alguns segundos para entender o significado dessas palavras, mas logo percebi que havia tocado naquilo que mais os movia: Ambição. Uma força poderosa que os impulsionava em busca da própria liberdade. Algo que eu compreendia bem.
— O que acham da ideia?
Eles trocaram alguns olhares entre si, tendo conversas das quais estive ausente, mas que pude imaginar pela resposta final deles.
— Vamos ouvir o que tem a dizer — disse Midos, sentando-se da forma correta em seu brilhante trono. — Mas não pense que confiamos em você ainda, Sonhador. Você ainda é…
— Segurem-se! — Gritou Mechion, acionando um alarme em toda a base.
Todos fizemos exatamente isso. Usando nossas auras, nos prendemos da melhor forma que conseguimos, um segundo antes de um impacto que fez a base tremer inteira. O corte abrupto da reunião deixou todos surpresos, mas os sorrisos que vieram a seguir tinham a mesma razão por trás.
— Ótimo! Finalmente algo para descer o sarrafo! — Clamou Kraken, batendo os tentáculos como se fossem mãos.
Os cinco saíram com pressa, querendo aliviar o estresse das últimas horas o quanto antes. O único que não saiu da sala foi Mechion, e eu esperei pela explicação do ocorrido.
— Alguém caiu na pista de testes de veículos rápidos — informou o orbiam enquanto criava uma projeção do arquipélago voador, mostrando onde foi o impacto.
Era a ilha onde estávamos, mas isso não parecia coincidência.
— Mostra a trajetória do impacto com a previsão de como seria se não tivesse parado na pista.
Entendendo o que eu queria, o computador vivo isolou a ilha e mostrou a linha que o inimigo percorreu. Estendendo-a, vimos que o caminho era claro demais para não ser intencional, pois seu percurso colidiria com uma pessoa sem sombra de dúvidas.
E essa pessoa era eu.

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