A Origem da Central Paracósmica - Capitulo 3
- Malp Dragon
- 23 de jan.
- 4 min de leitura
Reunião Tridimensional

A cena parecia saída de um filme de terror.
Ver uma versão de mim mesmo reduzida a uma cabeça flutuando em um tubo, com buracos e fios saindo de lugares desconfortáveis, deveria ser algo traumatizante. Mas eu não sou alguém comum, e aquilo estava, de certa forma, dentro dos meus padrões. Afinal, Genekit era apenas mais um dos meus alternativos.
— Tudo em cima, Genekit? — brinquei, com um sorriso enviesado, observando o tubo onde sua cabeça flutuava em um líquido esverdeado, suspenso no teto da sala.
— Melhor do que você — respondeu ele, sua voz carregada de ironia. Os tubos que sustentavam sua cabeça desceram com um chiado mecânico, trazendo-o à altura dos nossos olhos. — O que te deixou tão bravo a ponto de abrir aquela cratera?
— O pessoal da minha base me nomeou vice-líder. — Desviei os olhos, tentando esconder a fúria que queimava em mim. Uma tentativa inútil, considerando que todos nós éramos conectados pelo nosso dom, a Conexão.
A Conexão era o dom que compartilhávamos, um poder único atrelado às nossas almas. Por sermos versões alternativas de uma mesma essência, tínhamos o mesmo dom. Ela nos permitia nos comunicar mentalmente, compartilhar informações e conhecimentos, e até mesmo sentir as emoções uns dos outros. Um elo poderoso, mas às vezes irritante.
— Quê? — gritou Dragon no meu ouvido, sua voz ressoando como um trovão graças aos seus genes de dragão. — Eles são idiotas?
— Resumidamente, sim. — Massageei o ouvido, aliviando o zunido que ele havia causado. — Sua voz parece mais alta cada vez que a gente se encontra.
Dragon riu, coçando sua vasta juba. Entre nós, ele tinha, sem dúvida, o cabelo mais volumoso, superando até mesmo os ausentes desta reunião.
Uma sombra enorme passou por nós, e meu olhar se voltou para Napalm, uma cobra alada gigantesca, uma das crianças adotadas por Genekit. Seu tamanho real era suficiente para se enrolar da base ao topo do Everest, mas aqui, dentro do planeta-vivo Julgamento, ela voava em uma forma reduzida.
— Nossas crianças estão se divertindo — comentei, deixando um sorriso escapar ao ver minhas filhas e outros seres da família Genekit nas costas da serpente. Suspirei, absorvendo a cena por alguns segundos antes de voltar o olhar. — Qual o motivo da vinda repentina?
Nossas reuniões costumavam ser leves, momentos para conversarmos sobre a vida, trocarmos conselhos ou apenas nos divertirmos. Reuniões sérias, como essa, eram raras.
— Alguém abriu uma fenda na sua realidade — disse Genekit, direto ao ponto. Com um comando invisível, a sala escureceu, e os vidros se transformaram em telas que exibiam dados complexos. Graças à Conexão, eu conseguia entendê-los. — Anfini e Onirien já entraram na realidade do invasor para descobrir o máximo que puderem. Vera procurou irregularidades deste lado, mas não encontrou nada.
— Quem seria louco o suficiente para fazer algo assim? — Aproximei-me de uma das telas, que mostrava o local da ruptura: um ponto vazio no meio do oceano. — Tem que ser louco ou idiota para não saber as consequências.
— Na verdade — disse Dragon, colocando-se entre mim e a tela —, achamos que quem fez isso estava atrás de você.
Levei alguns segundos para processar aquilo. Não era novidade ser alvo de algo, mas um invasor dimensional? Isso era novo. E nada bom.
— Por que vocês acham isso?
— A ruptura emana uma aura semelhante à nossa. — Genekit mudou a tela para exibir uma representação energética. — Isso só pode significar que a pessoa conseguiu usar nossa Conexão como farol para invadir ou...
— Ou que essa pessoa possa ser um alternativo nosso — completei.
— É, mas considerando que nossos encontros não foram à base de pé na porta e tapa na cara, não achamos que seja a segunda opção.
Ele tinha razão. Nosso primeiro contato foi sempre mediado pelos sonhos, e a Conexão nos permitiu reconhecer uns aos outros. Alguém invadindo sem se apresentar não parecia ser "um de nós".
Antes que qualquer conclusão fosse tirada, senti meu celular vibrar. Uma mensagem de Mechion. Imaginei que fosse uma reclamação sobre Gina e sua tentativa de expor a magia ao mundo, mas o conteúdo era muito mais interessante.
— Isso tem potencial — murmurei, deixando um sorriso digno de vilão se formar em meu rosto. Guardei o aparelho e voltei minha atenção para a cabeça entubada de Genekit. — Algum problema se eu deixar as crianças se divertindo aqui?
— Claro que não — ele riu, já lendo meus pensamentos pela Conexão. — Quer ajuda para chegar lá?
— Eu aceito. Vai ser bom para o Dragon aprender.
— Ei! — protestou Dragon, indignado.
Eu e Genekit rimos.
— Vou só avisar para elas que estou de saída. Depois você pode me disparar lá.
Com isso, segui até a saída, minha mente ainda fixada na mensagem de Mechion. Eu achava que estaria sozinho com minhas filhas nessa situação, mas, pelo visto, o problema era muito maior do que eu havia imaginado.

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